A sete dias de tomar posse, uma parte dos analistas políticos passou a questionar se ainda há uma frente ampla em apoio ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em razão de um suposto “hegemonismo” dos petistas na ocupação dos cargos no novo governo. O que isso quer dizer? Primeiro, que dos 21 ministros anunciados até a sexta (23), 11 foram indicação de partidos políticos e os outros dez ministros representam, de modo geral, segmentos da sociedade civil, que são vozes plurais e legítimas de uma sociedade organizada, que resistiu ao bolsonarismo na linha de frente institucional.
Em segundo lugar, Lula encontrou um congresso mais bolsonarista e conservador depois de uma eleição polarizada na qual a extrema-direita avançou alguns passos o terreno legislativo, apesar da derrota de Bolsonaro à presidência. Logo os partidos de direita e suas respectivas bancadas mantiveram-se tomadas por bolsonaristas. Nessa direção, tudo indica que o petista vai precisar escolher os 16 ministros que restam tendo que ignorar uma negociação no “atacado”, tendo que levar “pedaços” destas bancadas para os ministérios.
Diante deste cenário confuso e rodeado de incertezas, a estratégia de Lula parece óbvia: dar espaço ao PT, aos partidos de esquerda e figuras notáveis enquanto o outro lado do espectro partidário se decide como deve se relacionar com o governo. Essa articulação revela um cálculo político já visto anteriormente, pois, retendo uma parte importante dos cargos sob sua influência, Lula conseguirá mais à frente reconfigurar o governo, reequilibrando os espaços para os partidos de direita, desde que ofereçam votos na Câmara e no Senado.
O padrão dos gabinetes ministeriais nos governos anteriores não foge tanto á lógica do que fazem os petistas. O primeiro gabinete de FHC em 1995, deu ao PSDB seis pastas (30%), o PFL ficou com outras três (15%), PMDB e PTB com duas cada (10%). Para as outras sete pastas, o presidente nomeou ministros sem filiação partidária (Ciência e Tecnologia, Esportes, Fazenda, Relações Exteriores, Saúde e Secretaria de Assuntos Estratégicos) e um independente (o cientista político Francisco Weffort, do PT, para a Cultura).
Para se ter uma ideia, o primeiro governo Lula teve uma forte representação do PT, que recebeu 18 ministérios (60%, tendo 37% das cadeiras parlamentares da coalizão). Os outros sete partidos receberam um ministério cada, sendo que foram nomeados cinco ministros sem partido (Agricultura, Defesa, Indústria, Justiça e Relações Exteriores). A frente ampla de Lula está posta e sem sobressaltos, pois terá que se adequar ao pragmatismo da governabilidade, algo que se desenvolverá a médio prazo a depender, inclusive, da popularidade do novo governo.
*Cláudio André é Professor Adjunto de Ciência Política da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) e um dos organizadores do “Dicionário das Eleições” (Juruá, 2020). E-mail: claudioandre@unilab.edu.br